O UNIVERSO DA PEDOFILIA
Morrem palavras desgastadas por um tempo devorador, mas crescem engastadas num tempo que é escultor.
“Dona” e senhora do coração medieval (herdeira da “mi dons” provençal), a palavra “Dona” transformou-se com o tempo em bengala de hierarquização social (D.ª). Desgastada em abreviatura, mais não é que a D. Maria do proletariado urbano, subserviente em relação à Srª D. Maria da alta burguesia, mas displicente em relação à ti’ Maria do povo rural ou à Maria, criada para todo o serviço e, às vezes, Mulher.
Engastada no tempo e sem perder nenhuma das suas mais-valias de expressão artística (e, por isso mesmo, sentimental), é amorosamente recuperada pela nova geração de adolescentes com o sentido arcaico de “eleita do meu coração”: a “minha dona” não se confunde no final do século XX e início do século XXI com a “minha garina”, a “minha miúda”, etc.
Vem esta reflexão de professora (pois foram os alunos que me explicaram esta nova versão de carinho amoroso), a propósito de um problema social que tem feito correr máquinas rotativas, impressoras de computador e tecer jogos verbais: orais (e anais, mais parecem alguns, com efeito...), expressões faciais (de amor, ódio, raiva, esperança... sentimentos que tais), etc... etc... e que dá pelo nome de PEDOFILIA.
Ao contrário da “Dona” medieval, amada e respeitada que o final do século XX vê ressurgir pela boca jovem dos adolescentes, a “pedofilia” (etimologicamente, amor às crianças) vê o seu percurso de palavra agonizar brutal e criminosamente nos lábios fálicos de um qualquer “erómano” militante.
Com efeito, “pedofilia” é palavra etimologicamente enraizada no grego (“paidos”= criança + “filos”=amor). O amor de “Filos”, que não é confundível na Grécia com o de “Eros”, subsiste em palavras como “Filosofia” (o amor à sabedoria), “Filantropia” (o amor ao ser humano) ou até no antropónimo “Filipe” (o que ama os cavalos). “Pedófilo” é, pois, por esta raiz de sabedoria arcaica, escorada na filosofia grega, um ser que sente o amor de “Filos” em relação às crianças. Na árvore genealógica de Pedofilia não há, pois, amor de Eros, mas – tentando definir o amor de “Filos” para português – respeito, carinho, atenção, dedicação, serviço... em relação às crianças e a favor das crianças. De facto, a relação que Eros institui com o corpo é uma relação de amor que procura na saúde física e psíquica a completude que em todo o ser humano é, simultaneamente, sonho palpável e efémero de um instante de eternidade e nostalgia breve de uma acronia universal. Menino travesso e ladino, de olhos vendados e sorriso à espreita, Eros é a brincadeira terna que une os corpos, a alegria breve que os enfeita e a sensualidade audaz que os desnuda. Em Amor, Eros mais não é que a “infância”...
Sob o olhar conspícuo de um “australopitecus”, vulgar galã de formas e velho sedutor da criança de olhos vendados (a criança ela-própria, o próprio corpo do Deus-menino: Eros), o “bébé” não é já mais do que um objecto roubado à sageza do mundo, à sensatez do humano e à alegria da maternidade (ou paternidade que, neste caso, é o mesmo). Erómano de si mesmo, o “pedófilo” (que assim hoje é chamado) vive a clausura social dentro de si. Doente, “maníaco de crianças”, chamar-lhe-ia com maior propriedade PUERÓMANO, neologismo criado sob o paradigma do “pirómano” ou do “cleptómano”, retirando assim da sua genealogia verbal toda e qualquer relação com o Amor que à Grécia repugnaria e só a Roma confundiria. E digo que a Roma confundiria, porque às três palavras que no grego expressavam o Amor (Eros, Filos e Agapé), Roma as (con)fundiu, gerando um “Amor” demasiado lato, que a civilização portuguesa a pouco e pouco foi também ela destrinçando pelo seu enriquecimento cultural/verbal. E é por isso que em Portugal temos o "amor do corpo" (erótico), o “amor da mente, espiritual” (filosófico) e o “amor ao outro” (filantrópico).
Por tudo o que disse, em pleno século XXI, a “Pedofilia” arcaica, grega, morreu. Morreu a palavra, porque morreu o Amor que lhe estava na génese. E por isso recorro à genética Roma, que (con)fundiu as três formas de Amor grego no seu “Amor, amoris”, para por via erudita nos criar um neologismo que diga a nova realidade psíquica dos que sofrem em português do amor erógeno pelas crianças: PUEROMANIA (“puer”=criança + “mania”=obsessão).
Assim sendo, o que a sociedade vem punindo não é o arcaico “pedófilo” que ama com amor desinteressado e humano a criança, mas o PUERÓMANO, o que investe na criança um erotismo adulto, não a respeitando como ser em formação, humana e psiquicamente falando.
Se “Chronos”, o Tempo, devorou o afecto da “mi dons” retirando-lhe o possessivo, transformando-a em “Dona” e “D.” Fulana de Tal, um Tempo novo a recuperou em afecto e ternura no final do século XX, com a recuperação pela gíria juvenil da “MINHA DONA” (=A MULHER QUE EU AMO: a “sinhor do meu coraçom” medieval).
Morrem palavras desgastadas por um tempo devorador, mas crescem engastadas num tempo que é escultor.
“Dona” e senhora do coração medieval (herdeira da “mi dons” provençal), a palavra “Dona” transformou-se com o tempo em bengala de hierarquização social (D.ª). Desgastada em abreviatura, mais não é que a D. Maria do proletariado urbano, subserviente em relação à Srª D. Maria da alta burguesia, mas displicente em relação à ti’ Maria do povo rural ou à Maria, criada para todo o serviço e, às vezes, Mulher.
Engastada no tempo e sem perder nenhuma das suas mais-valias de expressão artística (e, por isso mesmo, sentimental), é amorosamente recuperada pela nova geração de adolescentes com o sentido arcaico de “eleita do meu coração”: a “minha dona” não se confunde no final do século XX e início do século XXI com a “minha garina”, a “minha miúda”, etc.
Vem esta reflexão de professora (pois foram os alunos que me explicaram esta nova versão de carinho amoroso), a propósito de um problema social que tem feito correr máquinas rotativas, impressoras de computador e tecer jogos verbais: orais (e anais, mais parecem alguns, com efeito...), expressões faciais (de amor, ódio, raiva, esperança... sentimentos que tais), etc... etc... e que dá pelo nome de PEDOFILIA.
Ao contrário da “Dona” medieval, amada e respeitada que o final do século XX vê ressurgir pela boca jovem dos adolescentes, a “pedofilia” (etimologicamente, amor às crianças) vê o seu percurso de palavra agonizar brutal e criminosamente nos lábios fálicos de um qualquer “erómano” militante.
Com efeito, “pedofilia” é palavra etimologicamente enraizada no grego (“paidos”= criança + “filos”=amor). O amor de “Filos”, que não é confundível na Grécia com o de “Eros”, subsiste em palavras como “Filosofia” (o amor à sabedoria), “Filantropia” (o amor ao ser humano) ou até no antropónimo “Filipe” (o que ama os cavalos). “Pedófilo” é, pois, por esta raiz de sabedoria arcaica, escorada na filosofia grega, um ser que sente o amor de “Filos” em relação às crianças. Na árvore genealógica de Pedofilia não há, pois, amor de Eros, mas – tentando definir o amor de “Filos” para português – respeito, carinho, atenção, dedicação, serviço... em relação às crianças e a favor das crianças. De facto, a relação que Eros institui com o corpo é uma relação de amor que procura na saúde física e psíquica a completude que em todo o ser humano é, simultaneamente, sonho palpável e efémero de um instante de eternidade e nostalgia breve de uma acronia universal. Menino travesso e ladino, de olhos vendados e sorriso à espreita, Eros é a brincadeira terna que une os corpos, a alegria breve que os enfeita e a sensualidade audaz que os desnuda. Em Amor, Eros mais não é que a “infância”...
Sob o olhar conspícuo de um “australopitecus”, vulgar galã de formas e velho sedutor da criança de olhos vendados (a criança ela-própria, o próprio corpo do Deus-menino: Eros), o “bébé” não é já mais do que um objecto roubado à sageza do mundo, à sensatez do humano e à alegria da maternidade (ou paternidade que, neste caso, é o mesmo). Erómano de si mesmo, o “pedófilo” (que assim hoje é chamado) vive a clausura social dentro de si. Doente, “maníaco de crianças”, chamar-lhe-ia com maior propriedade PUERÓMANO, neologismo criado sob o paradigma do “pirómano” ou do “cleptómano”, retirando assim da sua genealogia verbal toda e qualquer relação com o Amor que à Grécia repugnaria e só a Roma confundiria. E digo que a Roma confundiria, porque às três palavras que no grego expressavam o Amor (Eros, Filos e Agapé), Roma as (con)fundiu, gerando um “Amor” demasiado lato, que a civilização portuguesa a pouco e pouco foi também ela destrinçando pelo seu enriquecimento cultural/verbal. E é por isso que em Portugal temos o "amor do corpo" (erótico), o “amor da mente, espiritual” (filosófico) e o “amor ao outro” (filantrópico).
Por tudo o que disse, em pleno século XXI, a “Pedofilia” arcaica, grega, morreu. Morreu a palavra, porque morreu o Amor que lhe estava na génese. E por isso recorro à genética Roma, que (con)fundiu as três formas de Amor grego no seu “Amor, amoris”, para por via erudita nos criar um neologismo que diga a nova realidade psíquica dos que sofrem em português do amor erógeno pelas crianças: PUEROMANIA (“puer”=criança + “mania”=obsessão).
Assim sendo, o que a sociedade vem punindo não é o arcaico “pedófilo” que ama com amor desinteressado e humano a criança, mas o PUERÓMANO, o que investe na criança um erotismo adulto, não a respeitando como ser em formação, humana e psiquicamente falando.
Se “Chronos”, o Tempo, devorou o afecto da “mi dons” retirando-lhe o possessivo, transformando-a em “Dona” e “D.” Fulana de Tal, um Tempo novo a recuperou em afecto e ternura no final do século XX, com a recuperação pela gíria juvenil da “MINHA DONA” (=A MULHER QUE EU AMO: a “sinhor do meu coraçom” medieval).
Na esperança que o mesmo processo recupere a “pedofilia” do seu passado próximo de dor e lhe traga pelo Verbo o engaste cronológico do Amor ... escrevo. Para que na origem grega se pense também a Língua Portuguesa.
Um texto que me deu especial prazer ler - e reler, pois já só entendo, razoavelmente, na segunda leitura e confesso que não teria grande nota, se fizesse exame sobre ele.
ResponderEliminarNo entanto, deu para perceber- Entendi, razoavelmente, Senhora Professora? - que se usa a palavra pedofilia de forma abusiva, adulterada, pois na sua génese teria um sentido bem mais altruista e digno, muito diferente daquele em que a encaixaram os nossos "mestres" da LP, que já não precisam de estudar Grego. Nem Latim.
Maria Luisa, com sua licença ainda vou aprender, por aqui, muitas coisas boas.
Bem haja!